Menores e direito a advogado em processo tutelar cível
Direitos e representação dos interesses de crianças e jovens
O novo Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC), Convenções Internacionais e diretivas europeias atribuem aos menores direitos processuais, quer no âmbito penal quer civil, em processos que lhes digam diretamente respeito.
Desde 1 de julho de 2014 que, em Portugal, por via da Convenção Europeia sobre o Exercício dos Direitos das Crianças, um menor de 18 anos tem direito a receber informação relevante e a exercer os seus direitos nos processos de família.
Os processos aqui abrangidos são os processos perante uma autoridade judicial que digam respeito aos menores – processos de família, nomeadamente relativos ao exercício das responsabilidades parentais, incluindo residência e direito de visita.
Nos termos desta Convenção, o menor de 18 anos tem direito a pedir para ser assistido por uma pessoa adequada, da sua escolha, que o ajude a exprimir as suas opiniões. Poderá pedir a designação de um representante diferente do que lhe tenha sido nomeado e, nos casos apropriados, um advogado.
O menor tem direito a nomear o seu próprio representante e o direito de exercer, no todo ou em parte, os direitos das partes em tais processos. Tem também o direito a ser informado e exprimir a sua opinião no âmbito dos processos e a solicitar a designação de um representante especial.
Além disso, uma diretiva da União Europeia obrigou já à atualização do estatuto da criança enquanto vítima no processo penal. No novo Estatuto da Vítima português, em vigor desde 4 de outubro de 2015, crianças vítimas têm o direito de ser ouvidas nestes processos, sempre tomando em consideração a sua idade e maturidade. É obrigatória a nomeação de patrono, que se faz nos termos da lei do apoio judiciário e sempre isenta de custas. Está vedada a divulgação ao público de informações que possam levar à identificação de uma criança vítima, sob pena de os seus agentes incorrerem na prática de crime de desobediência.
No âmbito do novo Processo Tutelar Cível, a criança tem direito a representação própria e até distinta da dos pais. O menor pode ter o seu próprio advogado, nomeadamente quando os seus interesses conflituem com os dos progenitores.
Representação no processo tutelar cível
A iniciativa processual nos processos tutelares cíveis cabe às crianças maiores de 12 anos, ao Ministério Público (MP), aos ascendentes, aos irmãos e ao representante legal da criança.
O MP é ainda quem trata de instruir e decidir os processos de averiguação oficiosa. Representa as crianças em juízo (intentando ações em seu nome e requerendo ações de regulação) e pode usar quaisquer meios judiciais necessários à defesa dos direitos e superior interesse das crianças.
Nos processos previstos no RGPTC é obrigatória a constituição de advogado na fase de recurso. A nomeação de advogado à criança é obrigatória quando os seus interesses e os dos seus pais, representante legal ou de quem tenha a guarda de facto, sejam conflituantes, e ainda quando a criança com maturidade adequada o solicitar ao tribunal.
O RGPTC regula o processo aplicável às providências tutelares cíveis e respetivos incidentes. Ao todo, são 12 providências tutelares cíveis:
– instauração da tutela e da administração de bens;
– nomeação de pessoa que celebre negócio em nome da criança e nomeação de curador geral que represente, extrajudicialmente, a criança sujeita às responsabilidades parentais;
– regulação do exercício das responsabilidades parentais e o conhecimento das questões a este respeitantes;
– fixação dos alimentos devidos à criança e aos filhos maiores ou emancipados e a execução por alimentos;
– entrega judicial de criança;
– autorização do representante legal da criança à prática de certos atos, a confirmação dos que tenham sido praticados sem autorização e as providências acerca da aceitação de liberalidades;
– determinação da caução que os pais devam prestar a favor dos seus filhos ainda crianças;
– inibição, total ou parcial, e o estabelecimento de limitações ao exercício das responsabilidades parentais;
– averiguação oficiosa da maternidade e da paternidade;
– determinação, em caso de desacordo dos pais, do nome e apelidos da criança;
– constituição da relação de apadrinhamento civil e a sua revogação;
– regulação dos convívios da criança com os irmãos e ascendentes.
Estes processos correm nas secções de família e menores da instância central do tribunal de comarca, normalmente, da residência do menor. Têm natureza de jurisdição voluntária. Como processos urgentes, correm durante as férias judiciais sempre que a demora possa causar prejuízo aos interesses da criança. Na falta de disposição especial, o prazo para a prática de qualquer ato processual é de 10 dias. O MP está presente em todas as diligências e atos processuais presididos pelo juiz.
Declarações das crianças como prova
O RGPTC prevê que a criança tem direito a ser ouvida, sendo a sua opinião tida em consideração pelas autoridades judiciárias na determinação do seu superior interesse.
É o juiz quem promove a audição da criança, a qual pode ter lugar em diligência judicial especialmente agendada para o efeito.
A tomada de declarações dos menores é realizada em ambiente informal e reservado, para permitir a espontaneidade e a sinceridade das respostas. A criança deve ser assistida no decurso do ato processual por um técnico especialmente habilitado para o seu acompanhamento, previamente designado para o efeito. A inquirição é feita pelo juiz, podendo o MP e os advogados formular perguntas adicionais.
As declarações da criança são gravadas mediante registo áudio ou audiovisual, só podendo ser utilizados outros meios técnicos idóneos a assegurar a reprodução integral daquelas quando aqueles meios não estiverem disponíveis e dando-se preferência, em qualquer caso, à gravação audiovisual sempre que a natureza do assunto a decidir ou o interesse da criança assim o exigirem.
Quando a criança tenha prestado declarações para memória futura, estas podem ser consideradas como meio probatório em processo-crime. Quando se trate de considerar as declarações da criança como meio probatório no processo tutelar cível, é preciso que haja observância do princípio do contraditório.
Regulação das responsabilidades parentais
A homologação do acordo sobre o exercício das responsabilidades parentais, nos casos de divórcio, separa ção judicial de pessoas e bens, declaração de nulidade ou anulação do casamento tem de ser pedida por qualquer dos pais, nos 10 dias subsequentes ao trânsito em julgado da sentença proferida na respetiva causa.
Uma vez autuado o requerimento ou a certidão, os pais são citados para conferência, a realizar nos 15 dias imediatos. O juiz pode também determinar que estejam presentes os avós ou outros familiares e pessoas de especial referência afetiva para a criança.
A criança deve ser ouvida pelo tribunal quando tenha mais de 12 anos ou, tendo menos, tenha capacidade para compreender os assuntos em discussão, tendo em atenção a sua idade e maturidade. Contudo, se essa audição for desaconselhada do ponto de vista da defesa do seu superior interesse, o juiz não a ouvirá.
Referências
Lei n.º 141/2015, de 9 de setembro
Convenção Europeia sobre o Exercício dos Direitos das Crianças, adotada em Estrasburgo, em 25 de janeiro de 1996
Lei n.º 130/2015, de 4 de setembro
Diretiva 2012/29/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, publicada no JO L n.º 315, de 14.11.2012
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FONTE: LexPoint |