Discurso do Presidente da Direção da APIPDF na IVª Conferência Internacional Igualdade Parental Séc. XXI – Évora

Discurso do Presidente da Direção da APIPDF na IVª Conferência Internacional Igualdade Parental Séc. XXI – Évora

 

Bom dia a todos e todas.

Em nome da Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Direito dos Filhos quero agradecer a presença a todos os oradores e oradoras, permitindo-me saudar em particular aqueles que a partir dos respetivos países tiveram a amabilidade de se deslocar até nós, como é o caso da Professora Hildegund Sünderhauf-Kravets, da Alemanha, da Juíza brasileira Jaqueline Cherulli. Quero ainda deixar uma palavra de apreço ao Professor Edward Kruk, que estava inicialmente previsto estar connosco, mas que por motivos de saúde não pode viajar.

Quero ainda agradecer às diferentes entidades e empresas que de uma forma ou de outra, tornaram possível a realização desta conferência e com especial destaque à Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Alentejo por ter cedido estas instalações e facilitado a logística desta conferência.

Ainda um particular agradecimento aos voluntários que estão aqui connosco e àqueles que contribuíram até hoje para fazer com que esta iniciativa corra bem e ainda aos ilustres elementos que aceitaram pertencer à nossa Comissão de Honra.

Por último, quero ainda expressar o nosso agradecimento a todos os participantes que aqui estão.

Pelo quarto ano realizamos a nossa Conferência Internacional Igualdade Parental Séc. XXI, este ano com o tema “Desafios da Coparentalidade”.

Com este evento anual, a Associação quer afirma-lo como um dos poucos eventos multidisciplinares na área das Crianças, Jovens e Famílias, que permita a consciencialização das problemáticas associadas, a reflexão de soluções e a ação urgente de todos e todas, profissionais das diferentes áreas, mas também para progenitores.

A temática deste ano foi escolhida pelos desafios que se colocam aos pais e mães que cuidam dos seus filhos e o querem continuar a o fazer nas situações de pós-divórcio e pós-separação. A paternidade e a maternidade têm estado num processo de transformação dinâmica acelerada no mundo ocidental, o que coloca necessariamente desafios, não só aos progenitores e suas crianças, mas igualmente às instituições e à comunidade como todo. As questões de género sobre a Parentalidade têm assumido uma nova importância e têm recentrado o nosso discurso e ação na necessidade de aprofundamento da igualdade nos cuidados prestados à criança. Os papeis identitários do pai e da mãe estão em constante redefinição e nas situações pós-separação ou pós-divórcio tornam-se mais importantes, quando os comportamentos de cooperação são substituídos pelos de antagonismo. Assim, devemos ter em conta que muitos progenitores não possuem as competências necessárias para negociar o rearranjo familiar que se exige numa situação de separação/divórcio. Esta família da criança, que deixa de ser uma família conjugal, mantém-se como família parental, pelo que necessita, muita das vezes, de ser ajudada. No entanto, é aqui que precisamos, hoje, de atuar e constantemente falhamos, não só as instituições, mas como comunidade, como cidadãos da República.

Na semana passada o Governo da República aprovou um conjunto de propostas de Lei que visam colocar a criança no centro do sistema. A APIPF já tinha apresentado a sua contribuições no âmbito da revisão do Sistema de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens em Risco e da Organização Tutelar de Menores, nomeadamente a obrigatoriedade da pré-mediação familiar, da importância do uso de planos parentais, a alteração das funções dos técnicos da Segurança Social no apoio às famílias em conflito, bem como das EMATs, a criação da figura do coordenador familiar ou gestor de processo, o reforço orgânico do modelo comunitário de promoção e proteção das crianças e jovens em risco, entre outras. Assim, aguardamos com expetativa a discussão que se irá realizar no Parlamento, em especial, como é dito no Comunicado do Conselho de Ministros do dia 21 de Maio passado, sobre “(…) a realidade dos graves danos psicológicos potencialmente sofridos pelas crianças em contextos de rutura conjugal e consequente perturbação dos vínculos afetivos parentais, especialmente agravada nas situações de violência domésti­ca intrafamiliar[1].

Mas se neste âmbito recebemos com agrado um desenvolvimento quanto às propostas de reforma do sistema, o mesmo já não podemos dizer quanto a algumas iniciativas parlamentares que se centram principalmente nos adultos, sem atender à realidade das falsas acusações em situações de conflito parental, prejudicando gravemente os direitos das crianças. Falo dos Projetos de Lei referente aos crimes de perseguição, alterações à OTM e reforço à proteção das vítimas de violência doméstica, apresentados por alguns partidos, que além de colocar em causa uma coerente reforma nesta área, assume-se como uma grosseira violação de princípios constitucionalmente consagrados. Ao contrário do que aconteceu em outros países, não podemos deixar que estas matérias passem sem uma discussão séria e alargada, não só pelos profissionais, mas por todos os cidadãos e cidadãs.

Posto isto, chegados aqui hoje, em 2015, o que pretendemos fazer?

Em Portugal, só no ano de 2013, ocorreram segundo os dados do Ministério da Justiça:

Corresponde a uma taxa de incumprimento de 132%. Ou seja, por cada regulação existe 1,3 processos de incumprimentos.

Esta realidade estatística, ainda que nos dê apenas um vislumbre dos problemas que se colocam à Parentalidade, coloca-nos a todos nós desafios, especialmente à promoção da Coparentalidade.

Como Conferência multidisciplinar pretendemos passar uma mensagem clara: Ainda hoje, a metodologia de trabalho seguida pelos diferentes profissionais que lidam com as crianças, em vez de cooperativa, acaba por ser desarticulada, centrada em aspetos de natureza processual, que acabam por adiar a intervenção nas famílias, com claros prejuízos relacionais e afetivos para as crianças, para os pais, mães e restante família alargada.

Tal como afirmamos na nossa Conferência sobre o Modelo de Cochem-Zell, que organizamos em 2011, com a presença do juiz alemão Jurgen Rodolf, necessitamos de um outro modelo para as questões das crianças e das famílias. E outro modelo é possível! O desafio que nos é lançado enquanto sociedade é aliciante e ao qual não podemos nos afastar: os profissionais que estão envolvidos na questão dos conflitos parentais têm que trabalhar de forma interligada e cooperante – magistrados, advogados, assessorias técnicas, gabinetes de mediação familiar e peritos de diferentes áreas, prevenindo/evitando a instalação do conflito, com claros benefícios para todas as partes envolvidas, especialmente para as crianças e atribuindo assim um outro papel aos Tribunais.

Esta conferência, pela sua diversidade de saberes que pretende partilhar é um contributo para esse caminho. Não podemos continuar fechados nos nossos saberes particulares, nas nossas práticas profissionais, nos nossos códigos de linguagem específicos, precisamos de saber como nos colocar no papel dos outros profissionais, como podemos construir um discurso comum, conceitos comuns, como nos podemos coordenar para que os nossos filhos e filhas não sejam vitimas de um dos maiores flagelos do nosso tempo, que é a violência a que são sujeitas nas situações de conflito parental e alienação parental.

A promoção da Coparentalidade como orientação central para o Superior Interesse da Criança, tal como é realizado em outros países, como os EUA, Austrália, Suécia, Bélgica, Brasil, entre outros, deve ser a bússola que nos tem que guiar a todos, pais, mães e profissionais. Como nos diz o Prof. Doutor Jorge Duarte Pinheiro “(…) o novo regime jurídico português do divórcio e das responsabilidades parentais é, inevitavelmente, um produto de valores e representações específicas, o resultado de certas ideologias e ilusões[2]” ou seja, “no campo do Direito da Família e das Crianças, a neutralidade legislativa é impossível”[3]. Nesse sentido, a promoção da Coparentalidade, como nos mostra hoje a evidência cientifica e a realidade de milhares de famílias, é o caminho que temos que trilhar em Portugal.

Termino apelando assim aos profissionais, organizações aqui presentes, mas também aos pais e mães, que trabalhem para melhorar a vida das nossas crianças, na relação livre e verdadeira com ambos os progenitores. Aos que quiseram estar presentes e aos que nos vêm pela Justiça TV, certamente na partilha e reflexão que existirá traduzir-se-á em ação, pois não só as nossas crianças merecem, como todos nós, como sociedade, precisamos de encontrar o caminho de uma paz social para a Parentalidade e para os nossos filhos e filhas. Falhar é impossível!

 

Obrigado.

 

Ricardo Simões

(Presidente da Direção da APIPDF)

25 Maio de 2015, Évora

 

 

[1] http://www.portugal.gov.pt/pt/os-ministerios/ministro-da-presidencia-e-dos-assuntos-parlamentares/documentos-oficiais/20150521-cm-comunicado.aspx

[2] In “IDEOLOGIAS E ILUSÕES NO REGIME JURÍDICO DO DIVÓRCIO E DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS”, pág. 3, em linha https://www.csm.org.pt/ficheiros/eventos/jduartepinheiro_ideologiasilusoes.pdf

[3] Idem, pág. 1

A ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA PELA IGUALDADE PARENTAL E DIREITOS DOS FILHOS tem por fim as actividades de carácter cívico, cultural, formativo e informativo, no âmbito da protecção e fomento da igualdade parental, nos seus diferentes níveis de intervenção – legislativo, jurídico, psicológico, mobilização da opinião pública, entre outros -, relativamente aos direitos dos filhos (crianças e adolescentes) cujos pais se encontrem separados ou divorciados.