Alienação parental

1.       A alienação parental existe? Se sim, o que é?

Sim, claro que existe! O fenómeno foi pela primeira vez identificado pelo psiquiatra norte-americano Richard Gardner (1985), no qual se identificam comportamentos por parte de um pai / mãe para manipular o seu filho com a intenção de predispô-lo contra o outro progenitor e a sua família (como os avós), cada vez mais frequente depois de um divórcio ou separação e mesmo em famílias não separadas.

Geralmente identificam-se os seguintes comportamentos:

- Processo destrutivo da imagem de um dos progenitores;

- Afastamento forçado, físico, psicológico e emocional, das crianças em relação ao progenitor alienado, geralmente o progenitor não residente;

- Actos jurídicos e comportamentais com o objectivo de isolar as crianças do progenitor com quem não reside habitualmente.

 

2.       A alienação parental é um fenómeno recente?

Não. A Alienação Parental pode acontecer mesmo em casais que estejam casados ou vivam juntos. Assim, já no passado, assistíamos dentro do casamento um progenitor manipular a criança para que tivesse uma imagem distorcida do outro progenitor. O que os divórcios e as separações em massa vieram fazer foi colocar este fenómeno a nu, tornando-o no problema social grave. 

3.       Quais as motivações (se é que poderemos falar em motivações generalizadas) que parecem estar na base da alienação parental?

Existem várias motivações que podem estar na base da alienação parental. A mais imediata e comum é a incapacidade de separar do conflito conjugal das tarefas parentais, pelo que o uso das crianças é o instrumento mais fácil para magoar o ex-cônjuge ou companheiro/a. Esta situação acontece muita das vezes porque ao progenitor residente são dados poderes/deveres acrescidos que o colocam numa situação privilegiada para manipular a criança contra o outro progenitor.

Outro tipo de razões relaciona-se com certas características psicológicas do progenitor alienado em gerir conflitos internos ou de dor, transformando a dor psicológica em conflito interpessoal. Aqui já estamos num nível de perturbação da personalidade, onde se observam muita das vezes comportamentos narcísicos e paranóicos nas relações e interações com outras pessoas. Não raro, nestas situações é a história familiar onde se denota a falta de ambivalência e incapacidade de se autonomizar na relação com os progenitores.

4.       Que meios o progenitor alienante costuma utilizar?

Como já foi referidoatravés do afastamento forçado, físico, psicológico e emocional, bem como de actos jurídicos (ex: requerimentos ao tribunal com falsas alegações) e comportamentais com o objectivo de isolar as crianças do progenitor com quem não reside habitualmente.

5.       A alienação parental pode estar associada a factores económicos? Como?

Pode. As crianças podem ser usadas como arma de arremesso com o objectivo de um dos progenitores conseguir uma pensão de alimentos que vá além das necessidades da criança. A desigualdade económica pode ainda ser usada como fator para que as crianças prefiram o progenitor que mais condições económicas tem, rejeitando o outro ou ainda esse argumento poder ser usado em tribunal para justificar que um dado progenitor tem mais condições para residir com a criança e assim afastar o outro do convívio regular. 

6.       A alienação parental pode dar lugar a sequelas graves na criança? A que nível e em que medida?

Sim, pode. De uma forma genérica podemos, entre outras, identificar as seguintes problemáticas:

Relações interpessoais: dificuldade em estabelecer relações de confiança com outras pessoas e em relações de maior intimidade;

Baixa tolerância à raiva e hostilidade: dificuldades em lidar com situações que despertem emoções fortes como a raiva (“ferver em pouca água”), em aceitar o “não”.

Problemas no sono e na alimentação: dificuldades em adormecer, pesadelos, sono inquieto; pode também existir falta de apetite.

Maior conflitualidade com figuras de autoridade: dificuldades em segui ordens e orientações de figuras de autoridade (professores, polícias, superiores hierárquicos, …)

Maior vulnerabilidade e dependência psicológica: auto-estima e auto-confiança mais baixas.

Sentimento de culpa: a criança é constantemente forçada a escolher um lado e tomar partido, crescendo com um sentimento de culpa e de impotência.

Doenças psicossomáticas: dores de cabeça , dores de barriga e outras são muito comuns de surgirem, em particular nas situações de stress.

 

7.       A alienação parental é reconhecida como doença psíquica?

Desde que o fenómeno foi pela primeira vez identificado pelo psiquiatra norte-americano Richard Gardner em 1985, têm surgido várias abordagens a este fenómeno, com dezenas de trabalhos académicos, bem como iniciativas de reflexão como congressos internacionais. Muita das vezes a discussão se o Síndrome de Alienação Parental deva ou não ser considerado como uma doença tem-se pautado por uma contaminação da ação ideológico-política de grupos de interesse, quem em nada tem ajudado ao debate sério e objetivo  Em Novembro de 2009 foi apresentada a proposta para incluir o conceito de Distúrbio de Alienação Parental na 5ª edição Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-V), da Associação de Psiquiatria dos E.U.A., que acabou por ser rejeitada. A inclusão deste conceito neste manual (ou ainda no The International Classification of Diseases (ICD)) iria contribuir para um melhor diagnóstico e intervenção dos diferentes profissionais (desde a área da saúde à da Justiça), com vista à prevenção deste fenómeno.  Dado não ser objecto de diagnóstico diferencial, por exemplo, nos processos litigiosos de regulação do exercício da responsabilidade parental, apesar da jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, esta iniciativa poderia ter trazido consigo uma  mudança do comportamento dos diferentes profissionais que lidam com este fenómeno, procurando evitar o conflito parental como estratégia de poder por parte de qualquer um dos progenitores.

De entre as várias e recentes abordagens ao fenómeno da Alienação Parental tem-se destacado a Dinâmica da Alienação Parental do Dr. Craig A. Childress, onde a vertente transgeracional assume particular importância, além de uma avaliação do mau-trato à  criança com base no DSM-IV. Pelo que assim se percebe que muitos destes comportamentos já se encontram reconhecidos pela própria comunidade científica. 

 

8.       Que medidas preventivas podem ser adoptadas?

 A primeira medida para prevenir a Alienação Parental é a consciencialização! Tornar-se consciente comportamento e do fenómeno enquanto realidade sóciojurídica é fundamental para a sua prevenção, quer estejamos a falar de profissionais da justiça, da saúde ou cidadãos.

A nível individual podemos ter três abordagens:

- recorrer à mediação familiar de forma a evitar que o conflito parental se instale e abra caminho à alienação parental

- procurar ajuda de terapeutas na área da saúde mental

- recorrendo ao sistema judicial e apelando ao uso de medidas de ação direta e indireta para que o convívio com a criança não seja quebrado.

9.       Que medidas repressivas devem ser aplicadas?

Os tribunais de família e menores já têm ao seu dispor um manancial de medidas, nomeadamente as de execução coercivas diretas e as de execução indireta. As primeiras dizem respeito a fazer cumprir pela força coerciva os "regimes de visita" ou mesmo a mudança de guarda e as segundas a soluções pecuniárias com finalidade reparadora, punitiva ou compulsiva.

10.   Como (sobre)vive o progenitor alienado?

 Muita das vezes o progenitor alienado encontra-se sozinho e revoltado, pelo que deve procurar ajuda especializada.

No entanto, existem um conjunto de ações que o progenitor alienado pode encetar no sentido de se tornar resiliente à situação de alienação parental. Ações como: procurar continuar a ter a sua vida própria, a nível social, profissional, efetivo, etc.; centrar-se na alteração do seu comportamento e não tanto na alteração do comportamento do progenitor alienador; deixar de ter medo do progenitor alienador; continuar a ser um pai/mãe, ou seja, procurando impor regras, educando, sem que com isso deixe de ser afetivo; procurar não ter sentimentos negativos para com o progenitor alienador; procurar ser assertivo; entre outras.

11.   E a criança alvo de alienação parental?

 A criança envolvida num processo de alienação parental começa a viver e, consequentemente, a desenvolver-se num ambiente caracterizado pela insegurança, hostilidade, incerteza...normalmente sente-se perdida, num acentuado conflito de lealdade, no conflito entre o amor que sente pelo progenitor que está ou é sentido como ausente e o ódio que é gerado pela impossibilidade de usufruir da presença e afeto do mesmo. Muitas vezes cresce a acreditar que o pai ou a mãe (geralmente o progenitor não residente) a abandonou, a conhecer os extremos amor/ódio comos as únicas formas de se relacionar com os outros e desenvolve a sua personalidade e identidade com base na instabilidade e angustia questionando constantemente a presença, apoio e amor de ambas as figuras parentais… a ambivalência marca a sua relação com ambos os progenitores, sendo, no entanto, evitado a todo o custo por estas crianças o risco de perder o progenitor a quem deve a sua lealdade, tendendo a rejeitar o outro, a promover a campanha denegritória e a confiar numa imagem negativa e geralmente negligente ou maltratante do progenitor não residente. Inicia então o seu papel ativo numa realidade que, não sendo interrompida ou questionada, se transforma a determinada altura na única possível e existente e na qual se move com comportamentos de rejeição e afastamento em relação ao progenitor não residente que podem camuflar uma mistura explosiva de sentimentos em relação ao mesmo (crescendo na ambivalência sufocante) ou o desenvolvimento de uma perigosa ausência de duvida e ambivalência.

Para sobreviverem, estes filhos tendem a recorrer, inconscientemente, a mecanismos primitivos de defesa como a repressão, o deslocamento, a projeção… a racionalização e o isolamento tendem a ser igualmente utilizados pela criança e/ou adolescente como meios de autoproteção.

Tudo isto pode dificultar o seu crescimento saudável bem como a aprendizagem ao nível do controlo de impulsos, desenvolvimento da autorregulação, resistência à frustração e competências de resolução de problemas. Crescem aprendendo a negar o conflito, a assumir o abandono e a negar a possibilidade de erro do progenitor que promoveu o processo de alienação parental.

12.   Qual o papel da Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Direitos dos Filhos perante casos aparentes de alienação parental?

A Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Direitos dos Filhos tem pautado a sua atuação na promoção de soluções que minimizem as consequências negativas para as crianças. Assim, o esclarecimento de questões básicas ligadas com as responsabilidades parentais ou a alienação parental permitem a quem nos procura perceber melhor o que lhe está a acontecer e assim escolher o caminho mais adequado a percorrer. A APIPDF possuí ainda os Grupos de Mútua Ajuda a funcionar por todo o país e que permitem a troca de experiências, sentimentos, partilha de estratégias de como lidar com o conflito e alienação parental e ainda a criação de redes de suporte/apoio.

O encaminhamento dos casos mais graves para profissionais qualificados e experientes neste tipo de comportamentos, também tem sido uma das ações da Associação.

 
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