Contrariar o Negacionismo sobre a Alienação Parental
Refutar as alegações contra a alienação parental como forma de violência familiar
Autor: Edward Kruk
Data de publicação do artigo: 8 de novembro de 2023
Publicado em: Psycology Today
Tradução: Beatriz Polónio
Revisão e adaptação: Andresa Lourenço e Ricardo Simões
Contrariar o Negacionismo sobre a Alienação Parental © 2025 by Associação Portuguesa para a Igualdade Parental e Direito dos Filhos is licensed under CC BY-NC-ND 4.0
Pontos-chave
- A alienação parental é uma forma de violência familiar que atinge relações saudáveis entre progenitores e filhos/as.
- O estado da arte científica sobre a alienação parental foi confirmada através de um vasto corpo de investigação.
- As falsas alegações contra o conceito de alienação parental podem ser refutadas com base nas evidências científicas existentes.
A alienação parental é uma forma complexa de violência familiar que visa um dos progenitores através da destruição da relação desse pai/mãe/familiar com o seu filho. As duas principais características da alienação parental são a rejeição injustificada da criança e a recusa de contacto com o progenitor visado, bem como as estratégias abusivas do progenitor alienante para denegrir o outro progenitor.
A alienação parental é um problema relacional que implica o cumprimento de cinco critérios: a criança recusa ou opõe-se ao contacto com o progenitor; a criança tinha anteriormente uma boa relação com esse progenitor; o progenitor não sujeitou a criança a violência, abuso ou negligência grave; o progenitor favorecido utiliza várias estratégias e métodos de alienação; e a criança apresenta sinais de distúrbios psicológicos ou comportamentais que podem indicar propensão para a alienação (Bernet et al, 2022). Os efeitos negativos da alienação parental sobre a criança e o progenitor visado são profundos, e a incidência de alienação parental é muito maior do que se assume comumente.
O estado da arte científica sobre alienação parental tem sido confirmada através de um vasto corpo de investigação (Harman et al, 2022), e o DSM-5-TR identificou os elementos centrais da alienação parental sob a condição de “problema relacional entre pais e filhos” (incluindo “atribuições negativas das intenções do outro, hostilidade em relação ao outro e sentimentos de afastamento não justificados”). No entanto, a alienação parental permanece controversa no domínio do Direito da Família, na formulação de políticas e na prática profissional, ainda que a oposição ao reconhecimento desta forma de violência familiar não esteja adequadamente justificada (Bernet & Xu, 2022).
Instrumentos como declarações enganosas, desinformação, erros, uso de técnicas de negação científica e deturpações do estado atual da investigação publicada em revistas científicas e da jurisprudência sobre violência entre parceiros íntimos e alienação parental têm sido levados a cabo por críticos veementes da alienação parental, e documentados por várias associações científicas. Em particular, a alegação de que homens abusivos apresentam falsas acusações de alienação parental para desviar a atenção da sua própria perpetração de violência com parceiros íntimos é utilizada para desacreditar o conceito de alienação parental e induzir ao pânico moral, sendo esta abordagem aproveitada por relatos mediáticos populares baseados em mal-entendidos sobre o conceito.
Os argumentos contra o conceito de alienação parental são facilmente refutados pela vasta quantidade de provas científicas que emergiram na última década, em particular no que diz respeito à violência entre parceiros íntimos, à violência familiar e à alienação parental. Para contrariar a alegação de que a alienação parental é uma fraude, é importante destacar o seguinte:
- Existe consenso científico de que a alienação parental é uma forma de violência familiar e violência entre parceiros íntimos, bem como uma forma de abuso infantil. Com mais de mil publicações sobre alienação parental, a maioria das quais são estudos empíricos publicados na última década, as estratégias abusivas dos progenitores alienantes foram bem documentadas, tal como os efeitos da alienação sobre as crianças e os progenitores, que constituem uma forma significativa de dano (Harman et al., 2022, 2018).
- A violência entre parceiros íntimos, a violência familiar e a alienação parental não são fenómenos com base no género; homens e mulheres são ambos perpetradores e vítimas. As alegações de que a violência entre parceiros íntimos é exclusivamente uma questão das mulheres, por um lado, e de que a alienação parental afeta apenas os homens, por outro, não são sustentadas pela investigação científica. A suposição generalizada de que as mulheres são em grande parte vítimas de violência entre parceiros íntimos e de que os homens são sempre os agressores é errada (Harman et al., 2018).
- A maioria dos casos de violência entre parceiros íntimos, violência familiar e alienação parental não são graves, mas a intensidade de cada um destes tipos de violência tem consequências devastadoras para ambos os pais/mães e para as crianças. Para os pais/mães afetados, a alienação parental é um evento traumático complexo; para as crianças, é um abuso infantil claro, causando uma perturbação mental significativa com base na falsa crença de que o progenitor alienado é perigoso e indigno. A falta de reconhecimento do abuso psicológico a que as crianças e os progenitores alienados são sujeitos em casos graves de alienação parental deixa-os vulneráveis, desprotegidos e em risco de danos severos (Harman et al., 2018; Kruk, 2018).
- É significativamente mais provável encontrar uma alegação comprovada de abuso contra progenitores alienantes do que contra progenitores alienados. Os progenitores que alienam os seus filhos têm 82% mais probabilidade de ter uma alegação de abuso comprovada contra si do que os progenitores alienados. Os progenitores visados têm 86% mais probabilidade de ter uma acusação falsa ou não comprovada de abuso contra si do que os progenitores alienantes (Sharples et al., 2023).
- Não há lugar a dúvidas quanto à necessidade de determinação judicial da residência da criança em casos de violência familiar comprovada; no entanto, é errado assumir que os casos de alto conflito, nos quais os pais/mães discordam das disposições de residência e convívios dos/as filhos/as após o divórcio, envolvem geralmente violência familiar grave. Isto coloca as crianças em risco de perderem um dos progenitores através de uma ordem de residência exclusiva ou de residência única e aumenta o risco de violência familiar na maioria dos casos em que a residência é contestada e anteriormente não envolvia violência (Kruk, 2018).
- Embora a maioria dos divórcios de alto conflito não envolvam violência familiar, metade dos casos de violência familiar que ocorre pela primeira vez surgem no contexto de divórcios adversariais do tipo “o vencedor leva tudo” e da ameaça de alienação parental. Alguns especialistas argumentam que o sistema adversarial de custódia de menores parece ser quase personalizável para produzir os piores resultados possíveis, em que os progenitores se polarizam quando as apostas são altas e os desentendimentos se transformam em conflitos intensos, com potencial para escalar para situações de violência (Kruk, 2018).
- A regulação das responsabilidades parentais que contemplem a residência alternada após a separação parental podem servir de defesa contra a violência entre parceiros íntimos, a violência familiar e a alienação parental, e constituir um fator de proteção para as crianças. Em média, os acordos que estipulam a residência alternada levam a resultados significativamente melhores para pais/mães e filhos/as no que se refere a todas as medidas de adaptação específica e geral ao divórcio do que os acordos de residência única e/ou exclusiva(Kruk, 2018).
- As alegações de violência entre parceiros íntimos e de violência familiar não são iguais a casos comprovados de violência familiar. As falsas denúncias de violência familiar/doméstica são comuns no contexto de divórcios adversariais do tipo “o vencedor leva tudo” (Kruk, 2018).
- Os dois fatores mais significativos para a adaptação das crianças às consequências do divórcio são a manutenção de relações significativas com ambos os progenitores dentro de um acordo ou sentença de residência alternada e a sua proteção contra a violência familiar. A segurança das crianças e dos pais/mães é a principal prioridade em casos de violência entre parceiros íntimos, violência familiar e alienação parental (Kruk, 2018; Harman et al., 2018).
- A violência entre parceiros íntimos, a violência familiar e a alienação parental devem ser encaradas como questões criminais, e os obstáculos à responsabilização dos perpetradores e à proteção das vítimas precisam de ser identificados e removidos. As vítimas de violência grave necessitam de total proteção por parte do sistema de justiça penal. Além disso, as autoridades de proteção infantil precisam de reconhecer e responder ao facto de as crianças testemunharem violência familiar, incluindo alienação parental, como uma questão de proteção infantil. Finalmente, o tratamento da alienação parental, que inclui a intervenção especializada com crianças e pais/mães visados e os programas de reunificação entre pais e filhos, é vital para o bem-estar das crianças e das famílias durante e após a transição do divórcio.